Às vezes, acabamos recebendo mais do que esperamos. Tanto para o profeta quanto para os herdeiros da profecia no livro de Amós, essa possibilidade se provou muito real. Amós era um fazendeiro e levava uma vida simples. Além de pastorear o gado, ele também ocupava seu tempo furando os figos dos sicômoros, um processo que permitia que eles amadurecessem mais rápida e totalmente (Amós 7:14-15). Não era um estilo de vida glamoroso, e Amós certamente não previu um futuro em que Deus o chamaria para condenar seus irmãos e irmãs em Israel.

Começou bem fácil. Os primeiros capítulos de Amós contêm palavras de condenação que certamente soam doces aos ouvidos dos que originalmente eram os ouvintes de Amós. O povo das tribos do norte havia sofrido com os caprichos das nações vizinhas e criado uma grande animosidade contra elas, e é fácil perceber o porquê ao ler os dois primeiros capítulos de Amós.

Em um refrão que se repete (“Por três transgressões […] e por quatro, não sustarei o castigo…” ARA), Yahweh, o Deus de Israel e comandante dos exércitos celestiais declara julgamento contra as nações vizinhas. A palavra traduzida como “crimes” ou “transgressões” é muito mais séria do que uma multa por excesso de velocidade, por exemplo. Ela traz o peso de atrocidades horríveis contra a humanidade.

Os israelitas desprezavam seus vizinhos, e não é difícil ver o porquê. Os sírios (representados em Amós 1:3-5 como Damasco) haviam conquistado brutalmente os territórios das três tribos do norte de Gade, Rubem e Manassés que se estabeleceram do outro lado do Rio Jordão (2 Reis 10:32-33). Foi uma derrota de proporções nacionais, pois os sírios venderam os israelitas dispersos como escravos com a ajuda dos filisteus, da cidade-estado de Tiro, dos amonitas e dos endomitas.

Isso deixou Israel ferido e furioso. Então, quando Amós, o pastor apanhador de figos, levantou-se na frente do povo e anunciou a voz estrondosa de Yahweh contra aquelas nações, os ouvidos de todos se atentaram. É claro que eles queriam ouvir o que o Deus de Jacó estava prestes a fazer àquelas nações. Eles queriam justiça pela violência cometida contra seu povo.

Os ouvintes de Amós olharam para os atos dos povos pagãos e os condenaram por violar a dignidade humana, desconsiderar a vida humana e infligir sofrimento ao povo de Deus. Não está muito longe do que os cristãos veem no mundo hoje. Não precisamos procurar muito para encontrar o que parecem ser alvos gigantes nas costas de cristãos ao redor do mundo.

E assim encontramos um pouco de camaradagem com o público original de Amós. O Deus que aniquilou o Egito não parece tomar levianamente as ações horríveis do mundo incrédulo quando se levantam contra o Seu povo. Existe uma espécie de doce satisfação em saber que o próprio Deus extinguirá as injustiças que o Seu povo sofreu.

No entanto, Amós não para por aí. Sua mensagem profética circunda mais perto de casa no segundo capítulo. Nele, o profeta se dirige a Moabe, que era uma nação-irmã de Israel, condenando-a por violar os mortos de Edom (Amós 2:1-3). Então Amós se volta para Judá — literalmente a outra metade de Israel —, no sul. Subitamente, o tipo de queixas muda:

“Assim diz o SENHOR: Por três transgressões de Judá e por quatro, não sustarei o castigo, porque rejeitaram a lei do SENHOR e não guardaram os seus estatutos; antes, as suas próprias mentiras os enganaram, e após elas andaram seus pais. Por isso, meterei fogo a Judá, fogo que consumirá os castelos de Jerusalém.” (Amós 2:4-5 ARA)

Foram-se as acusações de tratamento desumano. Foram-se as atrocidades de assassinato e violência. Em vez disso, Amós condena Judá por ter falhado em cumprir seu compromisso de aliança com Deus. Israel ainda se alegrou. Claro, estava um pouco mais perto de casa do que eles gostariam, mas pelo menos a maioria daqueles que viviam nas tribos do norte ainda estava honrando as exigências da lei, oferecendo sacrifícios e trazendo o dízimo. Certamente, eles estavam melhor do que Judá. Certamente.

Novamente, encontramos algo quanto ao qual podemos nos identificar com Israel. Todos os dias, as notícias trazem histórias de alguma igreja, ou denominação, ou celebridade cristã envolvida em escândalo. Não é difícil nos colocar no lugar de Israel, demonstrando e verbalizando desaprovação aos nossos vizinhos cristãos por suas falhas em permanecerem fiéis a Deus. Mas, fazendo isso, chegamos perto demais do fogo.

Como um mestre contador de histórias, Amós direciona a espada do julgamento de volta aos seus ouvintes na segunda metade do capítulo dois. Cada uma das nações que ele condenou até agora moveu o dedo apontado do julgamento de Deus progressivamente para mais perto de casa, e agora ele voltou sua atenção para Israel. Mas, como Judá, ele não condena Israel por violência, escravidão ou assassinato. Ele os condena pela maneira como tratam os pobres.

É uma enorme mudança de tom e seríamos perdoados por imaginar um público desorientado. É essa a Sua reclamação contra Israel? Todas as nações vizinhas são culpadas de assassinato e escravidão, e Deus começa uma briga com Israel sobre como eles tratam os pobres? Contudo é mais do que apenas isso. Em cada uma das acusações de Deus, Israel é culpado de abusar dos pobres e desamparados em busca da sua própria autoindulgência. Ao fazer isso, eles violam seu próprio relacionamento com Deus.

Ao longo dos capítulos três e quatro, Amós expõe o caso de Deus contra Israel. Yahweh libertou Israel do Egito e derrotou as nações pagãs de Canaã antes deles. Por causa da sua recusa em amá-lo por Sua bondade, Ele os advertiu com profetas e calamidades. Ele lhes concedeu a lei. Ele havia enviado as próprias nações sobre as quais os israelitas se regozijaram em ouvir que foram condenadas para despertar o povo.

Em vez de se arrepender, Israel explorou o pobre, o necessitado e o desprivilegiado entre eles a fim de adquirir riqueza, construir casas de férias onerosas e engordar com os alimentos mais selecionados (Amós 3:15; 4:1; 5:11). O povo de Israel achava que estava seguro; eles estavam “bem” com Deus porque ainda faziam tudo certo quanto à “adoração”. Apresentavam ofertas voluntárias, dízimos, ofertas de ações de graça e sacrifícios a Deus no templo, enquanto em casa exploravam o necessitado para seu próprio ganho.

E por causa dessa injustiça, Israel sofreria a ira de Deus. Eles ansiavam pelo julgamento de Deus porque pensavam que isso significaria o fim de seus inimigos políticos e das atrocidades do mundo pagão. Mas a verdade é que isso também traria sua própria destruição.

No capítulo cinco, temos uma das falas mais citadas e memoráveis ​​de todo o livro, a qual Martin Luther King Jr. ressaltou como as palavras de um ardente perseguidor da justiça (Cartas de uma prisão de Birmingham — tradução livre). Depois de rejeitar a adoração de Israel, Yahweh exige através de Amós: “Em vez disso, quero ver uma grande inundação de justiça, um rio inesgotável de retidão.” (Amós 5:24).

Os avisos de Amós são acompanhados de uma imagem de justiça com muito mais nuance do que possamos imaginar ou mesmo querer. A contenda de Deus com Israel girava em torno do fracasso do povo em manter a fidelidade em seu relacionamento com Ele. Seu problema não era com a adoração; eles guardaram bem as exigências do templo oferecendo dízimos, sacrifícios e adoração quase todos os dias. Seu problema era com a segunda parte do maior mandamento: amar o próximo (Levítico 19:18).

Como povo de Deus, somos chamados a um relacionamento com Ele que requer duas coisas: amor por Ele e uns pelos outros. Jesus mencionou aos Seus discípulos que o mundo reconheceria Seus seguidores não por sua religiosidade nem por sua defesa, mas por seu amor pelos irmãos na fé (João 13:35).

Se estamos falhando na igreja quanto a cuidar das necessidades de nossos irmãos e irmãs; se estamos falhando em obter justiça para eles baseados na cor de sua pele, renda anual ou opção política; se estamos negligenciando o sofrimento de outros cristãos para “somente pregar o evangelho”; se estamos apoiando celebridades para “manter a dignidade”, embora abusem de seu poder para molestar mulheres, entramos em rota de colisão com a condenação de Amós.

Não podemos ter um relacionamento correto com Deus se estivermos simultaneamente oprimindo, ignorando ou calando nossas irmãs e irmãos que merecem justiça. E quando a justiça de Deus realmente escorre como água, não nos encontraremos seguros na orla, mas no meio da torrente.

Perguntas para reflexão

  1. Você consegue se identificar com os israelitas do norte que se regozijaram com o julgamento vindouro das nações que os havia oprimido? Você consegue se lembrar de uma época da sua vida quando desejou justiça pelas injustiças perpetradas contra você? 
  2. Você já sofreu injustiça devido à sua fé em Cristo? Se sim, como?
  3. Quais são algumas formas pelas quais deixamos de tratar os outros com justiça, de não oferecer justiça aos oprimidos e misericórdia aos necessitados?
  4. Como podemos encorajar e ajudar uns aos outros a não cair na cegueira cultural e espiritual que Israel possuía, conforme descrito por Amós?

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